O livro de Oscar Miguelez: Narcisismos

por Maria Elisa lucato

 

O lançamento do livro do professor Oscar – Narcisismos – nos remeteu à importância e complexidade do tema estudado por nós na Formação em Psicanálise e sua relevância na clínica. A equipe do Acto Falho fez um convite ao Oscar para uma entrevista que elucida como ele articula o conceito do narcisismo (s) e o relaciona ao tema – Mercado – eixo desta nossa última edição em 2007.

Acto Falho: Tratando-se de um conceito dos mais complexos da psicanálise, qual a proposta de “Narcisismos”?

Oscar:

Justamente essa: devolver ao narcisismo a densidade conceitual que lhe é própria resgatando-o da banalização com a qual freqüentemente é abordado.

Acto Falho: Por que escolheu o tema nesta forma plural?

Oscar:

Com “narcisismos”, no plural, pretendo destacar a especificidade dos contextos nos qual esse conceito se articula na obra de Freud: psicoses, sexuação, pensamento, alteridade, luto, castração, etc. Embora Freud utilize o mesmo termo para todos esses campos, as diferentes articulações alteram significativamente a estrutura do conceito. Por isso proponho Narcisismos .

Acto Falho: Em que medida o conceito de narcisismo freudiano se diferencia do Kleiniano?

Oscar:

A obra de M. Klein em seu conjunto está voltada para o narcisismo com outros nomes: objeto parcial, defesas onipotentes da posição esquizo-paranoide, identificação projetiva e introjetiva, etc. Do grupo kleiniano só Rosenfeld dedicou-se ao narcisismo com esse nome. Um dos pontos de ruptura baseia-se num equívoco: a suposta anobjetalidade do narcisismo primário freudiano. Ocupo-me largamente desse equivoco no livro. É verdade que M. Klein afirma, ao contrario de Freud, a existência de relações de objeto desde o início da vida, mas, propostas como a de um “seio que morde”, protótipo da relação paranoide de objeto,aproximam-se muito da concepção freudiana do narcisismo na psicose. O ponto verdadeiramente crítico tem a ver com a sexualidade. O conflito possui sempre em Klein uma raiz na destrutibilidade. O narcisismo é em Freud sexualidade.

Acto Falho: Como o conceito de “Narcisismos” se encontra com a atualidade?

Oscar:

Banalizado e com freqüência reduzido a egoísmo ou egocentrismo .

Acto Falho: Acredita que a ênfase ao individualismo é provocada somente pelo marketing ou vem ao encontro do desejo do humano?

Oscar:

O individualismo é, segundo Louis Dumont, a característica mais relevante da ideologia moderna. Nesse sentido o marketing, esse invento tão moderno, só recolhe o mandato individualista, não o cria. A psicanálise no seu conjunto é produto do individualismo moderno. A pergunta a respeito de um desejo humano singular só é possível fora do âmbito das sociedades holísticas, por esse motivo a psicanálise não se desenvolveu nos paises de pesada tradição holística (Japão, China e Índia)

Acto Falho: No seu livro lemos que o narcisismo está presente na clínica contemporânea e na cultura em grande medida porque “as formas de deslocamento e transformação do narcisismo têm diminuído”. Poderia comentar seu pensamento?

Oscar:

A frase joga com a idéia de diminuição e de aumento em relação ao narcisismo. Sou crítico da utilização de categorias econômicas quantitativas para expressar diferenças na estrutura do narcisismo. Prefiro o plural: narcisismos. Não são todos iguais. Muito narcisismo ou pouco narcisismo soa parecido a muito ou pouco Édipo. O narcisismo é uma variante estruturante do psiquismo assim como o Édipo. Essa é também a minha crítica ás assim chamadas “personalidades narcisistas”, provocam a impressão que tem algumas que não o são.

Acto Falho: Como foi o processo de escrevê-lo ? E a decisão de publicá-lo?

Oscar:

Muito trabalhoso. Especialmente por ter que concomitantemente ao narcisismo apreender a escrever em português e no computador, foi uma tarefa tripla. Muito tenho que agradecer a Alejandro, meu filho jornalista, a paciência de Job nas correções e nas dicas de informática.

A publicação foi uma proposta da Editora Escuta feita por Manoel Berlinck que muito agradeço. Os quatro primeiros capítulos tocam o narcisismo de um modo tangencial.

e-mail: oscarmig@uol.com.br

 

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