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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    12 Abril de 2010  
 
 
PSICANÁLISE E POLÍTICA

Apresentação da seção Psicanálise e Política


EQUIPE DO BOLETIM ONLINE


Um balanço dos eventos do Sedes do ano passado

O ano de 2009 caracterizou um período de acontecimentos significativos, pela realização de eventos que se organizaram em torno de temas fundamentais na história do Sedes e do Departamento de Psicanálise. O fato aponta para uma reabertura da análise e do debate político?

No lançamento do livro Desarquivando a ditadura, tivemos a fala posicionada de Irmã Pompéa, sua evocação da Madre Cristina e da construção do Sedes como um espaço de acolhida para os que resistiam ou eram perseguidos, de liberação da palavra e denúncia do arbítrio. Na carta-aberta de Eduardo Losicer, publicada na edição anterior deste Boletim, a valorização do Sedes como lugar para o lançamento do livro Clínica e Política 2. Na abertura da mesa Clínica e Política, algo do que se detectava no ar foi transmitido pela fala de Heidi Tabacof, quando contou que, vindo para o Sedes para coordenar aquele evento, com o rádio ligado, ouviu-se surpreendentemente convocada a contribuir pessoalmente, aportando indícios, lembranças e documentos que possam ajudar a esclarecer o destino dos desaparecidos políticos. A recuperação da história faz parte, assim, da agenda política atual, e está ligada, no discurso e nas ações, à construção de cidadania como algo de todos e de cada um, em um trabalho permanente.

Sintonizar-se com um presente ressignificado historicamente, e com isso mais denso e mais rico, introduz um olhar em perspectiva, estimula a elaboração de projetos para um futuro. Possibilita também conquistarmos já um presente em que o mercado, por fim, pode ser apenas uma parte, mas nunca esse todo que acaba tornando a realidade esvaziada de tempo e de sentido.

Algumas questões suscitadas nos debates

A conferência de Oury, cheia de humor e lucidez, demonstrou quanto se buscou inovar na história institucional da psiquiatria e também nas instituições da psicanálise, mas também como os dispositivos novos podem desgastar-se, e como agora - especialmente no campo da saúde mental pública - se retrocede séculos, principalmente na Europa.

Não se consegue falar de história sem falar da atualidade, e isso de diversas maneiras. Na construção da democracia, na afirmação dos direitos humanos, o que se recupera, em uma luta ativa e continuada contra impedimentos que do contrário tendem a se perpetuar, e se elabora como história transmissível, faz parte de um trabalho de transformação do mundo que permita vir a "lembrar sem vergonha e esquecer sem culpa", de acordo com a proposição de Paulo Endo, no evento Trauma, memória e transmissão, realizado em outubro pelo Departamento de Formação em Psicanálise.

Por outra parte, quanto desse passado - não elaborado - está presente como repetição? Os sintomas da atualidade, a violência de classe, dos aparelhos de controle social, sexual e etário, os episódios de repressão policial do ativismo estudantil, etc. são repetições do não elaborado? Serão núcleos em que per-vivem práticas ditatoriais não superadas, indícios de uma transição demorada por vacilações, ou de uma democracia passível de ser chamada de paradoxal? A presença da tortura nas práticas policiais não poderá corresponder à marca dos genocídios do século passado e à quebra inerente e radical dos pactos humanos, que nos exigem sua recomposição e afirmação permanente? De que maneira se faz presente a relação entre psicanálise e política na formação atual dos analistas?

Uma nova seção para o Boletim

Várias vezes as atividades públicas do Departamento e do Sedes foram palco de exposições, reflexões e debates em que a relação entre psicanálise e política veio à tona como elemento central. Isto não garante per se sua continuidade, mas não deixa de ser promissor. Nós queremos fortalecer essa possibilidade. Ao longo dos eventos recentes, não deixamos de lembrar de depoimentos, documentos e trabalhos conexos, produzidos em outras ocasiões. Abrir uma seção do Boletim destinada ao tema permitirá superar os limites inerentes ao "artigo datado", assim como confeccionar eventualmente dossiês em torno de um determinado assunto, de uma vez ou em vários números. Às vezes, claro, dá vontade de publicar tudo de uma vez só, mas isso certamente não é possível, e tampouco, provavelmente, o melhor.

No contexto das discussões públicas em torno do Programa Nacional de Direitos Humanos - tema do debate deste mês no Sedes -, escolhemos recuperar, nesta primeira edição de 2010, a participação do Departamento de Psicanálise na mesa-redonda ocorrida no Sedes em 24 de outubro de 1997 - Ética e instituição psicanalítica -, destinado a debater o "caso" Amílcar Lobo. Tratava-se do médico carioca, candidato a psicanalista da Sociedade Psicanalítica de Rio de Janeiro, que participou das equipes de tortura do DOI-CODI de Rio na década de 70. Participavam da mesa-redonda Inês Etienne Romeo, que foi a militante que se apresentou, acompanhada de jornalistas, em seu consultório, e o reconheceu como o "Dr. Cordeiro", "nome de guerra" utilizado por ele quando participou em sua tortura; Helena Besserman Viana, analista carioca que fez chegar a informação até Mary Langer - que, junto com Armando Bauleo, fez pública a denúncia no livro Cuestionamos 2, de 1973. Por causa disso, identificada através de técnicas de investigação policial, Helena foi objeto de ameaças e perseguições na sociedade psicanalítica à qual pertencia, em meio da abstenção da IPA, o que é descrito em seu livro Não conte a ninguém. Foi a partir da apresentação do livro em Paris e frente às posições assumidas frente ao fato denunciado que René Major rompeu com a IPA, sendo este um dos antecedentes, entre outros, da convocatória ao Encontro Mundial dos Estados Gerais de 2000. Estava, por fim, entre os convidados, Cecília Coimbra, psicóloga e presidente do Grupo Tortura Nunca Mais de Rio de Janeiro, autora de um livro sobre a psicologia e a psicanálise no Brasil nos tempos da ditadura militar chamado "Guardiões da Ordem". Representando os departamentos psicanalíticos do Sedes, participaram Durval Mazzei, de Formação em Psicanálise, e Mario Fuks, de nosso Departamento. A transcrição da fala do Mario pode ser acessada desde a primeira página.




 
 
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