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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    13 Junho de 2010  
 
 
NOTÍCIAS DO DEPARTAMENTO

APRESENTAÇÃO DO GRUPO DE TRABALHO E PESQUISA EM PSICANÁLISE E CONTEMPORANEIDADE


O grupo foi criado em 2001: um espaço aberto para refletir entre pares as questões tão instigantes do contemporâneo, a partir do sofrimento evidenciado na clínica e nos fatos sociais. Uma interlocução entre pares para pensar quais ideais, papéis, trabalho e respostas são solicitados socialmente dos sujeitos hoje e como estas demandas incidem no processo de subjetivação.

O contemporâneo veicula exigências agudas sobre a perfeição dos corpos, acena com a eterna juventude, propõe uma liberdade dos sujeitos em relação à tradição e à história, oferece confortos tecnológicos e produtos sem precedentes. As mídias e a informática revolucionam o dia-a-dia, ultrapassando os referenciais de espaço e tempo - as informações e as trocas se dão no aqui e agora. Há um continuum de ofertas: informação, músicas, filmes...

Mas, também, o contemporâneo porta os traumatismos das situações extremas, genocídios, êxodos e campos de concentração, presentes desde o século XX com as grandes guerras. E tem a política atual da globalização e do neoliberalismo, com seu cortejo de extrema concentração de rendas, de violência e tráfico. E, ainda, as marcas deixadas no tecido social e nos indivíduos pelas ditaduras massacrantes do 3º mundo e, em passado recente, de muitos países da América Latina.

E... o mal-estar contemporâneo comparece na clínica pelo traumático, pela depressão, transtornos alimentares, toxicomanias, manifestações psicossomáticas, síndrome do pânico e outras sintomatologias. A dor psíquica transborda no corpo, perdendo as conexões simbólicas de sua história.

Esse é o legado clínico com o qual nos deparamos na nossa prática cotidiana, restos da sobredeterminação social, econômica e cultural, das exigências narcísicas de auto-suficiência, da recusa ao sofrimento psíquico e do esgarçamento dos laços sociais, além da velocidade das transformações dos valores e dos ideais. Do recrudescimento da violência social.

Nossas discussões se apóiam em textos sociológicos, artísticos, midiáticos e psicanalíticos para refletir. Então pensamos a globalização, a tecnologia, a velocidade, o consumo e vários aspectos do modo de vida atual.

A metapsicologia freudiana está sempre presente para pensarmos a construção da subjetividade, as primeiras inscrições, a diferenciação eu - outro. A concepção e a construção necessária de objetos e suas muitas determinações: a função objetalizante/desobjetalizante, o objeto fetiche, o objeto inerte, objeto parcial/total, da pulsão/de amor, objeto interno/transicional/ o outro real... a Coisa (das Ding)... o Outro.

Outro pilar das nossas reflexões são as várias concepções da pulsão de morte: compulsão à repetição, não ligação, destrutividade, irrepresentabilidade, mineralização ou, ao contrário, como criação de novas formas e configurações do viver - a sublimação na 2ª tópica.

Na figura clínica da adição, pensamos com Jammet a violência e a subjetividade aditiva como emblemática do consumo irrefreado de diversos objetos da cultura e da busca incessante de prazer e de gozo.  Interrogamos as filigranas da relação mãe-bebê, da constituição do auto-erotismo, das identificações primárias, das primeiras inscrições. A família e suas transformações estruturais, a crise da adolescência tornada vitalícia e a função das instituições tomaram nosso discurso.

Recorremos ao texto "O mal-estar na civilização" de Freud com frequência, para pensarmos os conceitos eu-ideal/ideal do eu e supereu, o lugar do líder como unificador do laço social.

Entre outros textos, o laço social foi pensado com o livro "A função fraterna" e com a autora Maria Rita Kehl. A fratria institui o pai como função e a ordem horizontal, embora mais tensa, é geradora de criatividade. A identificação horizontal e a construção do sentimento de pertinência a um grupo poderiam produzir, na ausência de um líder - mas não de lei - trabalho elaborativo e consequente contenção às formas expressivas do sofrimento atual?  Poderia oferecer elaboração também no que concerne ao esvaziamento da interioridade e à irrupção da violência? Que novas formas de sociabilidade são possíveis? Estas, entre outras, são questões que norteiam o nosso pensar.

Em 2006 o grupo realizou, em parceria com o Sesc-SP, o ciclo de debates " O mal-estar no cotidiano", que compreendeu dois eventos, com os temas "A violência nossa de cada dia", em 25/03/2006, e "Violência e desamparo na cidade", em 25/11/06. O objetivo do ciclo foi contribuir com o pensamento crítico que o grupo busca construir sobre a sociedade contemporânea e favorecer o surgimento de um espaço de elaboração sobre estas questões para um público mais amplo.

A violência e seus efeitos - sociais e nos sujeitos - têm sido debatidos e pensados através da clínica, dos fatos sociais, filmes, literatura. Trocas são estabelecidas com colegas do Departamento que têm pesquisas e trabalhos sobre estas problemáticas.

A adolescência, por ser o momento do processamento das identificações sociais e de locais de pertencimento, traz com maior evidência as questões que envolvem as subjetividades contemporâneas. O silêncio dos adolescentes, a menor diferenciação entre os sexos, a menor assimetria entre as gerações, a valorização do corpo e as exigências de perfeição, as forças de exclusão e de violência a que muitos estão submetidos é um outro eixo de discussão sempre presente.

Temos debatido a importância da linguagem, da narrativa, a literatura do testemunho para pensarmos o traumático, a violência e os esvaziamentos da elaboração simbólica presentes na cultura, no social e nas pessoas. Usamos como referencial textos de Walter Benjamin, como "O Narrador", para pensar a diferença de inscrição e de processamento subjetivo que as várias falas e os diversos discursos promovem.

Para pensar o mal-estar, a violência, as forças de exclusão, o impacto das "falhas ambientais", a necessidade de "objetos intermediários", o reconhecimento do papel e da constituição dos terceiros, hoje temos recorrido a vários autores: Freud, Jean Pierre Lebrun, Kaës, André Green e Marcelo N. Viñar.

Nos últimos tempos, temos nos debruçado sobre os textos de Viñar para pensarmos as questões que temos elencado: adolescência, ideais contemporâneos, violência, exclusão, tortura. Elegemos estes textos pela preciosa contribuição da sua forma de pensar e pelo fato de ter criado um dispositivo de intervenção:  os "grupos de palavras".

Com o objetivo de ampliarmos estas discussões, convidamos Marcelo Vinãr para participar deste evento, junto com outros colegas interessados nestas questões.

(1) Psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, integrante do grupo Psicanálise e Contemporaneidade, do grupo O feminino e o imaginário cultural contemporâneo, do GTEP e da equipe editorial do Boletim Online.



 
 
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