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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    17 Junho de 2011  
 
 
NOTÍCIAS DO CAMPO PSICANALÍTICO

Regulamentação das psicoterapias e Movimento Articulação


ANA MARIA SIGAL(1)



Entendi que poderia ser de interesse dos colegas que acompanham as questões de regulamentação da profissão de psicanalista encaminhar as últimas novidades que o movimento Articulação tem produzido, ao enfrentar uma lei que estava tramitando no Senado Federal para a regulamentação das Psicoterapias(2).

Depois de uma discussão teórica no grupo, na qual foram elaborados argumentos para opor a esta regulamentação que tinha começado a se agitar novamente no Senado, Articulação sugeriu o nome de dois colegas que iriam a Brasília para manter uma reunião com o revisor da lei, senador Borges.

Eles foram recebidos e, em uma conversa aberta e franca com o Senador, apresentaram os argumentos do grupo. O Senador solicitou a pasta para entender o momento em que estava o processo e confirmou que esta lei já tinha sido brecada no ano 2009 e que havia argumentos sólidos para suspendê-la - no entanto, alguns grupos políticos interessados na sua aprovação tinham começado a se articular novamente.

O encontro serviu para reativar a ideia de que seria renegado o curso do processo da lei, e que se ratificaria a proibição de que se apresente como projeto a ser votado.

Na sequência, relato alguns dos argumentos que foram invocados para impedir que a lei continuasse seu curso, e que nos pareceram interessantes e consistentes.

Trechos escolhidos do Parecer

"Não obstante as boas intenções do autor - motivado, pelo impulso, talvez, de garantir alguma proteção legal aos profissionais da área - entendemos que, sob vários aspectos, a aprovação do Projeto não é recomendável.

A esse respeito, entendemos que a proposição contém impropriedades nos seguintes pontos: inconstitucionalidade e impropriedade da criação de novo conselho profissional; inconstitucionalidade da atribuição de funções típicas de estado às entidades sindicais da categoria; inconstitucionalidade da criação de um programa de serviços de terapia e, por fim, contrariedade à regulamentação de outras categorias profissionais."

Quanto à inconstitucionalidade e impropriedade da criação de novo conselho profissional, temos a oferecer as seguintes considerações:

..............."A apresentação de propostas de regulamentação de profissões ocorre com grande frequência. No Senado Federal, há pelo menos quarenta projetos em tramitação, que cuidam de regulamentar as mais diversas ocupações. Desses projetos, muitos visam, também, a estabelecer um sistema de órgãos de representação e fiscalização de classe, para se somarem aos Conselhos Federais já existentes.

......."Todavia, a hipotética categoria de "terapeuta" se ressente de uma notável inconsistência, tanto na formação quanto na natureza da atuação de seus membros. Efetivamente, foram agrupados em uma única categoria, profissionais díspares como (sic): "Acupuntura (sistêmica, estética facial e corporal), Alexander, Auriculoterapia, Antroposofia, Ayurvédica (Terapia Ayurvédica), Apiteria, Aromaterapia, Bioenergética, Cinesoterapeuta, Crânio-sacral, Cromoterapia, Chi Kun, Do-in, Fitoterapia, Fitoterapia chinesa, Eutonista, Estética (Estética facial e corporal), Florais (Terapia Floral), Geoterapia, Hemoterapia, Hidroterapia, Homeopatia, Hipnose (Terapia Através da Hipnose), Iridologia, Indiana (Terapia Indiana), Magnetoterapia, Massoterapia (manual), Medicina Chinesa (Terapia Oriental), Meditação (Terapias Através da Meditação), Mio-facial, Moxabustão, Musicoterapia, Naturalismo (Terapia Natural), Neuropatia, Ortomolecular (Terapia Ortomolecular), Osteopatia, Psicanálise, Psicoterapia, Psicossomática (Terapia Psicossomática), Podologia, Quântica (Terapia Quântica), Qi Gong, Quiropatia, Radiestesia e Radiônioca, Regressão, Reflexologia (Reflexoterapia), Respiração (Terapia da Respiração), Reichiana (Terapia Reichiana), Rolfista, Rpgista, Rolfing, Shiatsuterapia, Tai-Chi-Chuan, Terapia do Toque (Reiki), Terapia Transpessoal, Termais, Tuina, Shiatsu, Yogaterapia ".

...."Em resumo, todas as modalidades de terapia física, psicológica ou espiritual que não sejam regulamentadas e sob a competência de outro conselho profissional foram incluídas no âmbito de abrangência do proposto Conselho de Terapias - e mesmo algumas que, como veremos, pertencem à competência de outros conselhos também o foram.

........"Ainda que, de fato, a atuação dos profissionais agrupados sobre a rubrica geral de "terapeuta" seja, inegavelmente, relacionada à questão mais ampla da saúde pública, é de se indagar se a criação de uma tal categoria - com delimitação tão ampla e imprecisa - poderia efetivamente representar uma garantia de segurança à população.

"Além disso, devemos ressaltar que a maioria das disciplinas abarcadas pelo proposto Conselho não dispõe de cursos de formação regular, cujo currículo e diretrizes sejam dirigidos e fiscalizados pelo Poder Público. Efetivamente, boa parte delas se encontra dentro do campo das terapias ditas alternativas, em relação às quais entendeu o Estado não ser cabível a sua atuação."

"A proliferação da regulamentação profissional, particularmente com a criação de órgãos específicos de fiscalização e registro, deve ser analisada de forma reservada. A adoção de tais normas pode escamotear, tão-somente, o intuito de criar uma reserva de mercado, que proteja profissionais com alguma formação específica, em detrimento da sociedade e da eficiência econômica do mercado de trabalho, ou ainda, a tentativa de legitimar, por meio de lei, o exercício de profissão cuja eficácia ou base teórica não seja inequivocamente reconhecida.

A criação de órgão de classe desse tipo pode dar ensejo, ainda, à formação de um grupo que domine politicamente o referido órgão e se aproprie das rendas arrecadadas da categoria, sem fornecer serviços de maneira eficiente.

Além disso, destaque-se que o projeto padece de vício insanável de iniciativa: a regulação de profissões por meio de Conselhos profissionais e congêneres constitui um traço tradicional de delegação de poderes do Estado.

Além da inconstitucionalidade quanto à iniciativa de sua propositura, o projeto padece, também, de inconstitucionalidade no tocante às atribuições dadas à Federação Nacional dos Terapeutas e aos sindicatos da categoria.

A Psicanálise, a Psicoterapia e a Terapia Reichiana são usualmente praticadas por profissionais habilitados em Psicologia. Sua fiscalização, portanto, é de competência dos Conselhos Federal e Regionais de Psicologia, estabelecidos pela Lei n° 5.766, de 20 de dezembro de 1971.

A justificativa é extensa, mas achei interessante apresentar alguns trechos que se expõem como discursos consistentes.

Vale também destacar que estes argumentos podem ser considerados para entender o risco de fazer uma lei que regulamente a profissão de psicanalista, porque, ainda que estejamos muito preocupados com a proliferação de cursos péssimos e inadmissíveis que exploram o nome da psicanálise em busca de lucros e prestígio, também queremos pensar a melhor forma de preservar a psicanálise, sem deformar seus princípios e sua ética.

Os evangélicos continuam avançando na oferta de cursos deploráveis e mantêm deputados no Congresso que, de tanto em tanto, querem profissionalizar a psicanálise.

Aqui podem observar uma propaganda que nos chega pela internet:


From: Bispo Walter Cristie Silva Aguiar bispowaltercristie@gmail.com
To: Fatef-reitoria fatefreitoria@gmail.com, "PR. WALTER CRISTIE" pastorwaltercristie@gmail.com, filosofiafatef@gmail.com, deputadofederalbispowaltercristie@gmail.com
Cc:
Sent: Sáb 08/01/11 13:46
Subject: Fwd: Seja um Psicanalista - Terapeuta ou Professor de Psicanálise

PSICANÁLISE_CLÍNICA.doc (71 Kb) attached

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FATEF
FACULDADE APLICADA DE TEOLOGIA, EDUCAÇÃO E FILOSOFIA
CURSO DE PSICANÁLISE CLÍNICA E LICENCIATURA EM
PSICANÁLISE
CURSO SUPERIOR (*) – LEI Nº 9394/96
Matrículas Abertas. Início das aulas em 15 de março de 2011.
Aulas uma vez por semana

Amparo legal
O Certificado é válido em todo o território nacional, conforme: Decreto Presidencial n° 5.154, de 23 de julho de 2004, Art. 1° e 3° e na Resolução do Conselho Nacional de Educação n° 04/99, Art. 3°, Inciso II, que tratam da educação profissional e Portaria 397 de 09/10/2002 do Ministério do Trabalho e Emprego – CBO nº 2515-50 e Aviso 257/57 do Ministério da Saúde, Parecer CONJUR/MS/CMA 452/2. Esta base legal garante aos alunos de nossos cursos obterem a credencial junto ao Conselho Internacional de Psicanalistas, Educadores e Teólogos Evangélicos - CIPETE, ou em outro órgão qualquer da categoria formada por psicanalistas, desde que devidamente credenciado de acordo com a legislação vigente em nosso País.

Início das aulas na sede da FATEF dia 15 de março (3ª feira)
Avenida Júlio Lima, 1054, Laranjal - São Gonçalo - RJ. Tel. (21) 2720-4817
(www.fatefrj.com.br)

No 2º semestre de 2011 teremos turmas no Rio de Janeiro, Nova Iguaçu, Volta Redonda, Nova Friburgo, São Pedro da Aldeia e Campos.
(*) No anexo, há informações completas do curso de Psicanálise.

Cordialmente,
Bispo Walter


As regulamentações legais que este curso oferece são simples decretos que tratam de educação profissional, portarias de ministérios e até de sindicatos de psicanalistas, que têm direito a existir, já que qualquer grupo de pessoas que desenvolve uma tarefa pode se unir e criar um sindicato, mas isto não os autoriza a legislar sobre a profissão.

O movimento Articulação tem se preocupado em combater as leis que possam, no Congresso, dar força nacional à regulamentação da profissão, para evitar que, aprovada a lei, seja feita a transgressão que permita a consolidação de instituições perversas.

Há pouco tempo uma instituição colocou na lista de seus membros todos os psicanalistas de instituições prestigiosas do Rio de Janeiro e hoje estamos consultando advogados para punir esta instituição e obrigá-la a retirar de sua lista os membros que não pertencem a ela.

Os que tanto valorizamos a prática e o exercício da clínica psicanalítica, sabemos que temos que batalhar pelas regras éticas da formação, mas também sabemos que estamos frente a uma complexidade que não permite outorgar titulação, nem garantir autorização, como se pode fazer em outras profissões, desde o momento que o pólo fundamental da formação é a análise pessoal. Esta experiência não tem avaliação, nem qualificação, esta é uma experiência absolutamente individual, de inconsciente, que faz impossível dar garantias sobre o outro. Quem poderia se responsabilizar pela forma em que trabalha o analista no uso de sua ferramenta fundamental - sustentando a transferência -, do modo que nossa prática exige? A transmissão da psicanálise não é o ensino de um saber teórico cujo desdobramento opera na clínica.

A psicanálise é a prática de uma ética e suas premissas são a responsabilidade e um compromisso com a verdade, uma verdade que não é única nem absoluta: a psicanálise trabalha com uma ética que privilegia a singularidade e as diferenças. É assim que, no movimento Articulação, encontramos diversas instituições, com ideias diferentes em relação à transmissão e à formação, mas com uma profunda convicção de manter um pensamento concebido como uma abertura à multiplicidade.

(1) Ana Maria Sigal é psicanalista, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, professora do Curso de Psicanálise e representante do Departamento junto ao movimento Articulação das Entidades Psicanalíticas Brasileiras.

(2) O projeto de lei n° 64/2009 foi publicado na íntegra no Boletim Online n° 15, dezembro de 2010.




 
 
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