“POR FAVOR, ME DEIXA FICAR AQUI”: A DEVOLUÇÃO DE CRIANÇAS EM PROCESSOS DE ADOÇÃO

 

Cassandra Pereira França

UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais)

 

Letícia Greco

Vara da Infância e Juventude de Minas Gerais

 

 

Eixo temático – A ESCUTA PSICANALÍTICA NA CLÍNICA AMPLIADA (o sofrimento da criança e o trabalho em instituições)

 

 

RESUMO

 

O presente trabalho presente desenvolver algumas reflexões acerca do drama vivenciado por algumas crianças que aguardam a conclusão de processos de adoção junto à Vara Cível da Infância e Juventude. À equipe técnica da instituição cabe a árdua tarefa de tentar identificar se há desejo para a adoção e se os pretendentes a pais adotivos estão preparados, emocionalmente, para as surpresas e desafios que serão colocados pela criança e por sua pré-história enigmática, carregada de inúmeros rompimentos, e de uma ânsia incomensurável de criar laços afetivos. Do lado dos adotantes é preciso que haja uma suspensão dos ideais construídos sobre o filho desejado e, em muitos casos, um enfrentamento do processo de luto necessário acerca da impossibilidade de gerar filhos. A condução deste trabalho, do ponto de vista técnico, é extremamente difícil, ainda mais quando os pais se deparam com questões narcísicas particulares ou se colocam a criança na função de ter de reparar as frustrações que eles enfrentaram por não poderem ter seus filhos biológicos. Desse encontro/desencontro de expectativas e desejos, poderão sair diversos desfechos: desde o início de uma nova família com potencial para ser feliz, como a “devolução” da criança à instituição que a acolhia enquanto experava pela adoção. A “devolução” costuma ter um efeito nefasto sobre a auto-estima já tão abalada da criança em questão. Muitas vezes a equipe técnica receberá de volta uma criança devastada, que em sua fala, traz como principal significante a palavra “nada”. Nada sente, nada deseja. Angústia que conduz ao vazio, ao isolamento, ao medo de confiar nos adultos. Uma infância praticamente perdida. Primeiro, porque muitos anos foram perdidos vagando de um lado para o outro, ao lado de uma mãe que não conseguiu proteger esta criança dos perigos oferecidos pela rua; segundo, porque muitos anos foram gastos dentro de uma instituição de acolhimento onde não havia particularização de quase nada, onde histórias de desencontros e abandonos se cruzavam constantemente. E, por fim, a criança acaba sendo colocada bruscamente frente a rejeição que se apresenta e que a lança no vazio de planos e garantias para o futuro. A condução clínica desses casos deixa o analista com a tarefa de através de intervenções e interpretações, colocar esta criança frente a um caminho de possibilidades. Caminho traçado não sem dor, nem de forma linear, mas que pode ajudar a criança a encontrar uma via de elaboração de tantas situações de sofrimento.

 

 

PALAVRAS-CHAVE: desamparo; perversão; adoção, devolução

 

CASSANDRA PEREIRA FRANÇA, Doutorado e pós-doutorado pela PUC-SP. Professora do Curso de Psicologia da UFMG (graduação e pós-graduação). Coordenadora do Projeto CAVAS/UFMG. Autora e organizadora de vários livros relacionados à clínica psicanalítica infantil.

 

LETÍCIA MARIA DE CASTRO GRECO RODRIGUES, Psicóloga do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.