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Resumo

A FADA-PALHAÇO: DA MEDICAÇÃO À CONSTRUÇÃO DE UM CAMINHO ANALÍTICO

Autora: Daniela Danesi (Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae)

Psicóloga pela Universidade de São Paulo, especialista em Saúde Mental  pela UNIFESP; membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae; membro do Conselho de Direção do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae Gestão 2006-2008; professora e supervisora do curso Clínica Psicanalítica: Conflito e Sintoma, do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. Atende em consultório particular em psicanálise com adultos e com crianças.

100 anos depois do pequeno Hans! Um longo caminho percorrido após as controvérsias entre Anna Freud e Melanie Klein, a possibilidade de alargamento das fronteiras da psicanálise, abrangendo entre outros o trabalho com a psicose, com as famílias, com casais, além da consolidação do trabalho com crianças e o reconhecimento de sua especificidade.

É levando em conta todo esse desenvolvimento do pensamento psicanalítico e das estratégias de abordagem clínica que foram se constituindo ao longo do tempo que nos defrontamos com um retrocesso em relação às rupturas que o discurso freudiano introduziu no discurso médico tais como: a escuta do sentido dos sintomas, as formações do inconsciente, a sexualidade infantil, a constituição psíquica a partir da relação com o outro. Enfim todo um campo de busca de significações e ressonâncias de sentidos no qual o foco principal recai na singularidade das marcas que constituem a história de cada sujeito.

De que retrocesso estamos falando?

À medida que o discurso psiquiátrico afasta-se da psicanálise e avança em direção às neurociências, ocorre um apagamento da subjetividade e uma redução do sujeito psíquico a um conjunto de disfunções neuroquímicas que vão ser reequilibradas com a administração da medicação adequada.

A questão surpreendente e assustadora é o quanto esse novo discurso aproxima-se do campo terapêutico de crianças.

Chegam à nossa clínica cada vez mais crianças medicadas tanto por psiquiatras como por neurologistas, muitas vezes com a anuência dos pediatras que as acompanham, em uma verdadeira cruzada de domesticação de comportamentos considerados inadequados ou fontes de sofrimento que pode ser facilmente (leia-se quimicamente) controlado.

Gostaria de relatar, neste trabalho, o atendimento que realizo com uma garota de 12 anos que foi medicada dos 5 aos 10 anos devido a um diagnóstico de ADHD, para reafirmar a importância do trabalho com o inconsciente e com a criação de espaços transferenciais nos quais as mensagens enigmáticas podem encontrar um campo de circulação e posterior significação.

O olhar médico que não incluiu as implicações psíquicas da história da criança e da possibilidade de oferecimento de um espaço de escuta para ela e seus pais, resultou no acirramento de certos sintomas, com conseqüências iatrogênicas sérias tanto para a criança como para sua família.