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Trabalhos

O que dizer do pai em uma produção independente?

Caroline Geocze
Psicóloga pela PUC-SP, Especialista em Psicologia Hospitalar pelo HCFM/USP e Mestre em Saúde Pública pela FSP/USP. Há 12 anos atua como psicanalista em consultório, além de ter um percurso de pesquisa acadêmico na área de saúde da mulher e saúde reprodutiva. Como instituição de formação está ligada ao Fórum do Campo Lacaniano/SP.

Resumo

Atualmente vivemos em uma era onde a tecnologia faz parte importante do nosso cotidiano, inclusive permeando campos íntimos do sujeito humano como o de sua procriação. A possibilidade de gerar filhos em laboratório torna-se ferramenta importante para mulheres que optam por vivenciar a chamada “produção independente”. O que antes era chamado de mãe solteira, algo visto com preconceito e como consequência de uma triste vida amorosa, passa a ser nomeado com um significante que coloca em pauta a ideia de independência.
Nessa nova nomeação, há muitos pontos implicados que desaparecem em um olhar despercebido. De repente, não existe mais a necessidade de se ter um casal para que um bebê seja gerado e, nem mesmo, do ato sexual em si. Os vínculos afetivos são liquefeitos, os laços sociais se fragmentam. O que parece se fortalecer é a saída proposta pela ciência e pelo discurso capitalista para todo e qualquer desconforto: de pílulas para dormir, acordar, sentir, não se angustiar e até mesmo para prover um bebê no momento certo, do jeito desejado.
Mas uma pergunta insiste em se inscrever na produção independente: o que dizer do pai? Freud dá um lugar estruturante ao Complexo de Édipo no sujeito, falando do pai como quem interdita a mãe e se põe no lugar da lei. Com os avanços teóricos do ensino de Lacan, o lugar do pai na teoria psicanalítica passou por mudanças importantes: o Édipo passa a ter um caráter não só estruturante do sujeito como estrutural. O Édipo é um dado de estrutura e não uma contingência de cada arranjo familiar. Assim, do ponto de vista da estrutura, ter ou não ter um pai presente é uma questão que passa a ser secundária. Lacan irá trabalhar com o conceito de metáfora paterna, onde se dá a inscrição do significante Nome-do-Pai onde antes havia o desejo da mãe. Essa operação simbólica é de tamanha importância que estará na base do entendimento acerca das estruturas clínicas na teoria lacaniana. As condições para que o sujeito possa advir estarão relacionadas à metáfora paterna e não ao pai físico ou biológico.
Contudo, as mulheres que se submetem a uma gestação desse modo insistem na pergunta: o que dizer do pai? O que dizer sobre esse lugar vago? Construir essa resposta é algo que pode ser feito no um a um em um processo de análise, onde é possível tecer a estória acerca dessa escolha.

Palavras-chave: produção independente, desejo, metáfora paterna, Lacan.