Pai perverso: reverberações identificatórias.
Cassandra Pereira França |
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Resumo O atendimento clínico de crianças vítimas de incesto tem nos mostrado, ao longo de dez anos de pesquisas acadêmicas, uma das facetas mais cruéis desse grave problema social: a identificação com o agressor. Um dito emblemático “Até os vilões podem ser bons!”, solto com insistência por uma pequena paciente, mostra-nos como a defesa denominada por Freud como Verleugnung , é um recurso providencial nesses casos, uma vez que coloca o episódio traumático numa condição de enclave psíquico, separado e incomunicável, permitindo à criança, assim, continuar amando e obedecendo ao pai. De fato, os processos de clivagem são incomparáveis em sua eficácia de criarem barreiras e segregarem porções da realidade (objetiva e subjetiva), mantendo-as lado a lado. Aliás, talvez até se constituam em um dos recursos psíquicos mais profícuos para lidar com o inadmissível da experiência humana. Mas, a qual preço? A do amortecimento da memória, da afetividade e da condenação da criança a uma construção identificatória perversa?
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