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Trabalhos

O "B" mudo

Flávia Steuer
Fonoaudióloga , mestre em fonoaudiologia clínica pela PUCSP, psicanalista e membro aspirante do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae.

Resumo

O presente trabalho pretende expor o que se pôde formular acerca de um sintoma a partir da experiência de análise com uma criança. A queixa inicial, uma inibição da leitura, parecia indicar uma dificuldade de aprendizagem. Entretanto, no encontro analítico, por meio da transferência, a criança isolou um dos elementos envolvidos na formação de seu sintoma. Foi em torno desse elemento que a análise desenvolveu-se. Seu sintoma mostrava-se cifrado em uma dificuldade de leitura: “não consigo ler o b mudo, como na palavra obstáculo”. Utilizando vinhetas clínicas, pretendo ilustrar como o sintoma da paciente, de seis anos, aos poucos revelou outros sentidos e causas que não uma dificuldade de aprendizagem. A questão em jogo articulava-se a um não dito, um segredo mantido pelo casal parental. Aos olhos dos pais, a paciente era apenas uma menina desprovida de recursos para o enfrentamento de acontecimentos previsíveis e esperados na vida de uma criança - uma menina que incapaz de ler “corretamente” não saberia, portanto, interpretar a vida. A paciente acabou por identificar-se com este "não poder saber", que se desdobrou em "não poder ter voz": "não poder ler", cabe dizer, o que sua realidade familiar apresentava. De minha parte, a posição transferencial permitia reler seu sintoma sob outra ótica; sem que o aparente problema de leitura fizesse obstáculo ao trabalho analítico.

Palavras-chave: sintoma, inibição da leitura, o não-dito, diagnóstico diferencial.