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Trabalhos

Alguns cuidados na escuta de crianças e das questões de gênero

Vanessa Chreim: Psicologa pela PUC-SP, membro acadêmico do Departamento Formação em Psicanálise, atuou na área da educação, hoje atende na Clínica do Instituto Sedes Sapientiae no Projeto de Atenção à Infância e no Grupo Acesso, além do consultório particular.

Eixo temático: Sexualização da Infância

Resumo

O presente trabalho busca delinear alguns aspectos do atendimento a crianças que apresentam questões relacionadas a gênero, ressaltando a especificidade da sexualidade infantil e sua expressão na fantasia, segundo aportes psicanalíticos. Desta forma, considero de grande importância o discernimento de que a sexualidade infantil tem como referencial a castração e o atributo fálico, prévios à consideração do genital feminino como um outro sexo, e que implicam na fantasia infantil um lugar afetivo em relação a seus pais. Assim, contrasta da sexualidade adulta, esta referida à genitalidade. Por meio do relato do atendimento de uma criança de cinco anos, procuro estabelecer de que forma este motivo de consulta se relaciona com a dinâmica psíquica do paciente e de seus pais. A partir dessa consideração, busco refletir acerca da condução do caso e do campo de intervenção que promove uma análise de crianças, como um espaço que permita a formulação de questões e interrogações, e não de definições sobre a futura sexualidade do paciente. Levando em conta a complexidade do assunto e o fato de ainda persistirem muitas incertezas na condução destes casos, inclusive de adultos, procuro identificar possíveis atravessamentos e desafios que permeiam estes atendimentos. Assim, problematizo a patologização da questão de gênero: este trabalho tem a intenção de distanciar a identidade transexual de um transtorno psiquiátrico, e aproxima-la de uma compreensão psicanalítica do sintoma e do sofrimento psíquico, e dos meandros da sexualidade. Portanto, considero que seja possível uma elaboração da relação entre o corpo e suas narrativas. Resgato contribuições freudianas para a reflexão clínica, embora aponte que estas têm suas limitações, inclusive relacionadas às atribuições de gênero daquele momento histórico-cultural. Assim, enfatizo a necessidade de se considerar que as identificações de feminino e masculino coexistem, embora possam estar permeadas por ambivalências e contradições. Desta forma, se relacionam com o contexto cultural e familiar, e deixam marcas na trama edípica, na constituição do sujeito e na relação com o corpo. Por fim, partindo destes pressupostos aponto que se a intenção de uma interferência cirúrgica for apenas readequar a correspondência entre sexo e gênero, ela pode ser insuficiente como alternativa de tratamento para estes pacientes, e corre o risco de destinar novamente a questão à anatomia e não à identidade.  


Palavras-chave: gênero, criança, sexualidade, psicanálise