Não há pior inimigo do que o inimigo dentro de casa...

Silvia Petrilli

 

 

Savater (o autor de Ética para meu Filho) escreveu: Uma das características de todos nós, seres humanos, é nossa capacidade de imitação. A maior parte de nosso comportamento e nossos gostos é copiada dos outros. Por isso somos tão educáveis e vamos constantemente aprendendo os sucessos conquistados por outras pessoas em tempos passados ou latitudes distantes. Moreno, o criador do Psicodrama, ao comentar sobre as suas experiências (e as de Zerka, sua esposa) com o filho Jonathan, de 4 anos, sobre a inversão de papéis no ambiente familiar, descreve como interpreta, para além da atitude lúdica da imitação, a atitude de Jonathan de desejar reproduzir a mãe: passar batom e pó compacto, após assisti-la frente ao espelho do banheiro. Diz textualmente: trata-se de um esforço para entrar em sua mãe e levá-la para dentro de si próprio.

Ao considerar este aspecto do comportamento da criança, Moreno provoca em mim a reflexão sobre a dimensão desta característica funcional da formação humana, em termos do dia-a-dia em nossa sociedade atual. O que nossas crianças estão levando para dentro delas? E quando as atitudes dos pais, imitadas pelas crianças sugerem caminhos perigosos?

Neste momento um filme veiculado na mídia televisiva e cinematográfica, que alerta para os riscos das cópias piratas (de DVD, em especial), explora a negligente atitude de pais diante dos filhos, de “dar um jeitinho esperto” (algo bem conhecido de nossa cultura) de conseguir as coisas de forma ilícita e desrespeitosa. Junto a isto algumas lembranças da experiência clínica: uma menina de 9 anos relata na segunda-feira após as eleições, que seu pai e ela, em tom de cumplicidade, comemoraram a esperteza de terem “furado a enorme fila” da secção de votação... ; um menino de 12 anos comenta alegre, vitorioso e prepotente sobre a esperteza dele e de sua mãe por terem feito uma “gambiarra” para captação da programação de TV a cabo, “sem pagar nenhuma mensalidade a eles” (refere-se à empresa), “nadinha de tostão eles vão ganhar de nós”.

Paralelamente, em sessões de trabalho familiar, os pais dessas crianças se queixam, cheios de preocupação, sobre a injusta vitimização por bullying ( zoar, gozar, tiranizar, ameaçar, intimidar, humilhar, isolar, enganar, perseguir, ignorar, ofender, bater, ferir, discriminar e colocar apelidos maldosos ?, em geral um grupo agressor contra uma criança escolhida como vítima) , e o roubo do relógio e do celular sofridos por seus filhos nas escolas.

E aí, meu caro colega psicoterapeuta... Você fica parado ouvindo essas incongruências, ou você se posiciona, orienta e tenta “educar” pais e filhos?

 

Maio 2007

 

Para comentar a matéria, escreva uma mensagem para:
Silvia Petrilli
silpetr@uol.com.br