Entrevista com Heloísa Junqueira Fleury para site DPSedes - Março 2008

Entrevistadora: Silvia Petrilli (Coordenadora da Área Comunicação – DPSedes)

Heloísa Fleury é Coordenadora Geral do Departamento de Psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae (2008-2009), psicóloga formada há 31 anos pela PUC - São Paulo e Mestre pela Faculdade de Medicina da USP. Sua principal atividade profissional é a Psicoterapia. Fez vários cursos de formação e aprimoramento profissional, com destaque para a Formação no Instituto Sedes Sapientiae, onde é atualmente, professora do Curso de Especialização em Psicodrama – Nível I. Também é Supervisora no ProSex - Projeto Sexualidade da Faculdade de Medicina da USP, onde ministra aulas e orienta Monografias em Curso de Especialização em Sexualidade Humana. Organizou livros, escreveu artigos científicos publicados em Revistas Científicas e em Anais de Congressos brasileiros e internacionais. Proferiu diversas palestras informativas tanto para um público especializado como para pessoas interessadas em desenvolvimento pessoal. O principal foco em sua vida profissional é a atividade psicoterapêutica clínica, mas também desempenha funções como gestora de políticas institucionais.

Você tem sido uma importante referência nacional e internacional em Psicodrama e em Trabalhos Grupais. Pode nos contar o seu percurso junto à IAGP?

Agradeço esse reconhecimento, mas podemos dar um desconto nessa importância. Sou membro da IAGP há muitos anos. Em 2003, fui convidada para ser a co-chair do Comitê do Programa Científico do 16º Congresso Internacional de Psicoterapia de Grupo. Foi uma oportunidade maravilhosa para conhecer colegas de todo o mundo, assim como para identificar novas tendências nessa área. Após essa experiência bem sucedida, fui membro do Comitê Internacional do III Encontro Mediterrâneo da IAGP, que aconteceu recentemente em Barcelona, e estou na função de Consultora do Comitê do Programa Científico do 17º Congresso Internacional de Psicoterapia de Grupo e Processos Grupais, que ocorrerá em Roma, em 2009.

Você foi eleita membro do Board e participa como Chair da Seção Transcultural, não é mesmo?

Sim. Em 2003, fui eleita membro do Board da IAGP, para uma gestão de 3 anos, e em 2006, chair da Seção Transcultural da IAGP. Nessa função, que seguirá até o Congresso de Roma, em 2009, tenho tido excelentes oportunidades de contato com colegas interessados em temas culturais. Temos uma lista de discussão, aberta a todos os interessados em trabalhos grupais, de todas as abordagens teóricas (inscrições no site www.iagp.com ). Nessa lista, além de discutirmos vários temas, o mais interessante tem sido o fato de que esse grande grupo virtual, com participantes de mais de 100 países, tornou-se um espaço para vivenciarmos a complexidade decorrente de nossas próprias diferenças culturais, de abordagem teórica. Estou muito empolgada com os desdobramentos que estamos planejando para o Congresso de Roma, quando pretendo acionar uma estratégia que inclua trabalhos práticos para enriquecer os debates promovidos pela Seção Transcultural durante o Congresso.

Recentemente você apresentou, em Barcelona, um trabalho sobre a análise dos resultados da pesquisa realizada pela Seção Transcultural da IAGP, da qual você é coordenadora, envolvendo correspondentes de 26 países. Fale um pouquinho sobre os resultados.

Essa pesquisa foi um marco em minha experiência profissional, porque me permitiu ter uma visão mais ampla sobre o Psicodrama praticado no Brasil. Houve uma grande adesão de psicodramatistas brasileiros, e talvez ainda maior dos Terapeutas Comunitários. Foi possível obter importantes contribuições sobre as alterações nas práticas grupais, que tem acontecido em função de nossa cultura e das demandas sociais. Estou preparando uma apresentação desses resultados para o XVI Congresso Brasileiro de Psicodrama. Acredito que o reconhecimento de nossas peculiaridades será um importante estímulo para novos avanços científicos. Houve uma excelente repercussão dessa pesquisa na IAGP.

Em contato com psicodramatistas e diretores de práticas grupais de vários países e culturas, você deve ter uma visão sobre as características do trabalho psicodramático e grupal que se destacam em termos comparativos. Que tal apontar algumas delas?

O psicodrama brasileiro tem uma proposta mais científica, com forte influência da teoria sistêmica, da psicanálise, de estudiosos da América Latina, entre outros. Isso traz uma precisão na aplicação da metodologia e na proposta de avaliação de resultados.

Outra diferença é a fidelidade, talvez excessiva, às propostas de J.L.Moreno pelos brasileiros. Isso pode estar dificultando o reconhecimento do psicodrama brasileiro, que tem uma forte influência do criador, mas já tem características diferenciais importantes. Isso favoreceria maior definição e ênfase aos nossos próximos passos. Talvez uma evidência da sensibilização dos brasileiros para essa limitação foi a mudança recente do Estatuto da FEBRAP, que não mais menciona exclusivamente J. L. Moreno, mas inclui outros teóricos.

E sobre a direção de grandes grupos?

Internacionalmente, as abordagens de fundamentação psicanalítica têm desenvolvido a teoria da direção dos grandes grupos a partir do aproveitamento de resultados de pesquisa da Psicologia Social e outras áreas. Uma síntese importante desses estudos consta no capítulo escrito por Haim Weinberg e Stanley Schnider, do livro Práticas grupais contemporâneas, organizado por mim e pela Marlene Marra. Nesse mesmo livro, há um dos textos mais atuais sobre grandes grupos numa perspectiva psicodramática, escrito pela nossa professora e associada Anna Maria Knobel. Nesse livro ela desenvolve um estudo comparativo entre o psicodrama e a sistematização feita no capítulo mencionado. Não poderia deixar de mencionar que a Anna Maria Knobel dirigiu um grande grupo durante os três dias do III Encontro Regional do Mediterrâneo, ocorrido recentemente em Barcelona, em parceria com o colega espanhol Roberto de Inocencio. Mesmo tendo sido uma experiência complexa, por ser um grupo multicultural, além de uma experiência de co-direção inédita para eles, foi brilhante a atuação da Anna, que pode demonstrar sua maturidade profissional. Eu gostaria de fazer um convite para que ela discuta conosco seu processamento dessa experiência, para que possamos analisar diferenças culturais e teóricas.

O Psicodrama dedica-se à Psicoterapia e também às intervenções chamadas Socioeducacionais (em educação, organizações, na sociedade e comunidades, saúde etc.). Como você percebe o desenvolvimento desses dois campos, em âmbito internacional, em comparação com as intervenções praticadas no Brasil?

No Brasil, as intervenções socioeducacionais têm tido um grande desenvolvimento, o que nos coloca numa posição diferenciada na experiência com populações em vulnerabilidade social. Isso nos aproxima de outras culturas que sentem a necessidade de novas metodologias para trabalhar a inclusão social de populações migrantes, especialmente aquelas que viveram em contextos de conflitos, como guerras, torturas e perseguições políticas. Na Seção Transcultural da IAGP, estamos atentos às estratégias para trocas de experiências nesse tópico.

Você está à frente do Departamento de Psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae. Quais projetos pretende estimular no DPSedes?

O DPSedes é minha casa, onde tive os primeiros contatos com o Psicodrama científico, há mais de 20 anos. Nesse período, participei, com muita dedicação, em muitas atividades. Hoje, sinto que tenho uma nova bagagem de experiência pessoal adquirida na IAGP e também na FEBRAP.

Meu projeto mais querido para essa gestão que se inicia, compartilhado com as colegas da Coordenação Executiva DPSedes 2008/2009, é fomentar a excelência do Psicodrama, tanto com nossos alunos em formação e docentes (níveis: I, II e III) como com os psicodramatistas associados. Estamos voltados tanto para a excelência nos Cursos de Formação e em nossas atividades científicas, como também na atenção às novas demandas sociais e novas contribuições científicas, inclusive de outras áreas.

Sobre a atenção às novas demandas sociais, pode nos oferecer um exemplo?

Um exemplo de nossa atenção às mudanças sociais e a urgência em buscarmos estratégias de atualização constante de nossos associados, há o reconhecimento recente pelo Brasil da categoria de refugiado. Trata-se de uma população que geralmente sofreu um trauma pré-migração e vive sob condições adversas, próprias da aculturação a um novo país, o que gera um estresse. O DPSedes planeja responder à essa demanda social, com a promoção de atividades e estímulo à reflexão e aprimoramento entre nossos associados.

Reconheço que estar “antenada” nas novas oportunidades de fortalecimento institucional foi um grande estímulo na minha função de Presidente da FEBRAP por duas gestões (1999/2000 e reeleita em 2001/02) e nas diversas funções que tenho desempenhado na IAGP. Nossa equipe de trabalho ampliada, incluindo a coordenação, docentes e colaboradores do DPSedes, está ainda mais atenta, o que, tenho certeza, fará ressonância no grupo e será uma fonte importante de crescimento pessoal para todos nós e para o DPSedes como um grupo.

 

Muito obrigada, Heloísa.

Foi um prazer estar aqui com você.

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