O sofrimento como condição da vida e os sofrimentos evitáveis

Dirce Fátima Vieira

 

 

Caros leitores(as),

Conversamos na nossa primeira coluna sobre a contemporaneidade contextualizando assim as variáveis que retro-alimentam nossas carências, vulnerabilidades e nosso desequilíbrio. Nesta, refletiremos sobre o sofrimento como condição da vida e os sofrimentos evitáveis.

Sabemos que o sofrimento faz parte da condição humana. Quem nunca teve uma dor ou quem nunca sofreu?

O sofrimento sempre foi um tema que interessou filósofos, religiosos, pensadores, poetas, psicólogos e é parte intrínseca da natureza humana, portanto podemos considerar que é um dos sinais da sua normalidade. Somos humanos e dotados desta condição.

A espécie humana, que tem como uma de suas características ser criadora de cultura, elabora e interpreta suas experiências de sofrimento conforme as diferentes sociedades. O significado do sofrimento vai se modificando ao longo do tempo e tendo outras representações que são captadas e expressas pelo imaginário coletivo.

Se o sofrimento é intrínseco ao existir não tem que necessariamente ser encarado como a desgraça fatal que sobrevém e nos torna infelizes, mas sim como algo contínuo de um existir único, finito e que pode nos fazer crescer. O mesmo pode-se dizer da felicidade, do prazer e de outras sensações e sentimentos que entendemos fazer parte inseparável da vida humana. O sofrimento como uma tonalidade afetiva da consciência sadia e da vivência normal, faz com que ele seja uma possibilidade de entender o mistério de nossa história, resignificá-la e responder eticamente pela vida.

Apesar de saber que o sofrimento é universal, e não estamos querendo abolir esta noção, mas pensando em minorar o sofrimento de alguns, queremos aqui refletir e discutir sobre os sofrimentos evitáveis, ou seja, aqueles que não necessariamente devem fazer parte da existência humana, aquele sofrer que provavelmente foi criado inconscientemente por nós, que se constituiu na nossa forma de viver em relação aos outros e ao mundo. É um padrão de comportamento que acaba gerando sofrimentos recorrentes, criando assim uma predisposição psicológica expressa por uma atitude de sofrimento diante da vida funcionando como uma droga.

Assim os viciados em sofrimentos são aqueles que padecem em silêncio e nem eles ouvem o seu grito, seu lamento. Provavelmente acabam pensando sobre suas dores e acham que não tem sorte, que tudo parece dar errado, que seu destino é sofrer e consequentemente acabam se sentindo desvalorizados e com auto-estima prejudicada. Essas pessoas têm uma atitude na vida de insegurança, ansiedade, derrota e pessimismo, não conseguindo se conectar com sua saúde psíquica. Neste vício não existe uma droga concreta, muito menos externa, mas sim uma forma de se relacionar consigo e com o mundo ao seu redor. A droga, se assim podemos chamar, seria o ganho secundário com esta atitude repetitiva que estes têm diante da vida de sempre sofrer por algo. Assim como acontece nos viciados em uma substância (lícita ou ilícita), comida, chocolate, exercício físico, jogo, consumo ou qualquer outro substrato possível para um vício, existe um prazer momentâneo. No caso que descrevemos o substrato é a dor no sofrimento e a atenção que se recebe dos outros como ganhos secundários por essa atitude sofrente. Essa experiência é vivenciada como fugaz e seguida por uma sensação de frustração que remete consequentemente à falta, vazio ou carência inicial caracterizando a forma cíclica de uma dependência, porque algo de essencial não foi preenchido ou reconfortado.

Na próxima coluna falaremos sobre o padrão de comportamento do viciado. Até lá.

 

Junho 2007

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