Ana Karlik
Camila Brasiliano
Ludmila Frateschi
Márcio de Assis
Rodrigo Veinert
Kleber Araujo
No dia 04 de fevereiro aconteceu o Grito de Carnaval Unidos do Inconsciente, na Praça Irmãos Karmann, próxima ao Instituto Sedes Sapientiae. Ele foi idealizado e produzido por nós, um grupo de seis amigos cuja peculiaridade é ser formado por psicanalistas, músicos e psicanalistas-músicos. Além disso, os psicanalistas estão em formação no Departamento de Psicanálise.
Começou numa brincadeira de bar e foi ganhando corpo: em algumas reuniões, compusemos letras que parodiam as marchinhas tradicionais, utilizando conceitos da psicanálise, além de um hino original no mesmo espírito. Lemos também um manifesto, replicado abaixo, em que tentamos explicitar o que nos moveu. Para nós, o humor presente nos blocos de carnaval, a ocupação festiva do espaço público e a celebração da diversidade são instrumentos de promoção de saúde mental.
Logo de início, tivemos a adesão de colegas psicanalistas tanto da formação quanto de outros espaços de trabalho. Estimulamos as pessoas a se fantasiarem, também inspiradas na psicanálise (havia gente de superego, seio bom e seio mau, Pulsão, Homem dos Lobos Mau) e oferecemos máscaras de Freud, Klein e Lacan para quem quisesse. No dia do festejo, compareceram diversas pessoas interessadas pelo carnaval e pela psicanálise, e que viram nesse ato a implicação de psicanalistas com seu tempo, com a cultura e com a cidade. Fomos surpreendidos pela grande repercussão do Grito: nossas letras foram muito replicadas nas redes sociais, recebemos muitos comentários elogiosos e chegamos a dar entrevistas para canais da grande mídia. Decidimos então inaugurar uma tradição: o Unidos do Inconsciente não terá apenas existido em 2016, mas desde 2016. Em 2017, estaremos nas ruas novamente, como bloco oficializado na programação do carnaval. Nossa ideia é diversificar nossas marchinhas, realizando para isso um concurso de novas paródias psicanalíticas.
UNIDOS DO INCONSCIENTE - MANIFESTO
O carnaval e a psicanálise têm em comum serem tentativas de libertar o amor recalcado.
O Unidos do Inconsciente é um grito de amor liberto. É investido de libido, uma energia, tomada como grandeza quantitativa - embora não mensurável - relacionada com tudo aquilo que pode ser abrangido pela palavra 'amor'. Amor que é cantado pelos poetas, amor sexual. Mas não separamos disso o que partilha igualmente o nome de amor, de um lado o amor a si mesmo, do outro o amor aos pais e aos filhos, a amizade e o amor aos seres humanos em geral, e também a dedicação a objetos concretos e a ideias abstratas. Este bloco nasceu do nosso amor, pela rua, pelo samba, pela psicanálise, uns pelos outros e pelo humor.
O Unidos do Inconsciente é um devaneio, uma fantasia, um sonho. O sonho não consegue expressar de forma alguma a alternativa 'ou-ou'; ele costuma incluir os membros dessa alternativa num só contexto, como se tivessem direitos iguais. Altamente notável é o comportamento do sonho em relação à categoria da oposição e da contradição. Essa categoria é simplesmente negligenciada; o 'não' parece não existir para o sonho.
Nos sonhos envergamos a semelhança com aquele homem mais universal, verdadeiro e eterno que habita na escuridão da noite primordial.
No bloco, coube tudo, couberam todos, nossas diferenças e nossas semelhanças. Couberam todos os nossos desejos e sentimentos, condensados, deslocados e transfigurados nessa brincadeira de uma noite. Uma flor não nos parece menos esplendorosa se suas pétalas só estiverem viçosas durante uma noite.
Afinal, foi carnaval, e como Freud, não permitimos que nenhuma reflexão filosófica nos tire a alegria das coisas simples da vida. Pensamos, mas assumimos existir também onde não pensamos, onde pulsamos, onde brincamos, onde sonhamos.
Sem recalque e sem castração, meu amor. Hoje é carnaval.
UNIDOS DO INCONSCIENTE - PARÓDIAS
Mamãe eu quero
Mamãe eu quero
Mamãe eu quero
Mamãe eu quero te amar
Papai não deixa
Papai não deixa
E ameaça o meu falo castrar
Sonha menino do meu coração
Condensa e desloca pra não ter censura não
Queria minha mãe, mas não posso ir pra cama
Maldita lei do incesto sublimar se não vem cana
Dora (Aurora)
Se você não fosse histérica
Ôooo, ô Dora
Veja só que bom que era
Ôooo, ô Dora
Tão linda, indiferente, não aguenta o amor
Seduz todos os homens nesses dias de calor
Um K antes do nome, você teria agora
Ôooo, ô Dora
Lacan não é fácil não (Cachaça é água)
Se você pensa que Lacan é fácil
Jean Jacques não é fácil não
Tem que sacar de imaginário, função paterna e pulsão
A gente tenta sublimar tudo na vida
Dor, amor, tesão
Só não dá pra sublimar o preço alto da sessão
Pode me faltar o amor e disso eu até acho graça
Só não quero que me falte
Pulsão de vida nessa praça
Sem calote (marcha do remador)
Se o paciente não pagar, olê, olê, olá
Eu vou cobrar (2x)
Venha, venha, venha, por favor
Mas se não vier, mesmo valor
E se na sessão você faltar, mesmo assim eu vou cobrar
Aliviar os males (Mulata Bossa Nova)
Maria Rita Kehl
Contardo Caligaris
Pi-si-Ca-Nálise
Lê lê lê lê lê lê lê lê
Pra aliviar os males
Sintoma revela (O teu cabelo não nega)
O teu sintoma revela uma marca
Porque essa marca é da dor
Mas como a dor expõe uma falta
A falta remete ao horror
Venha! (Ô abre alas)
Ô Abre a porta, vem se analisar
Ô Abre a porta, vem se analisar
Sou todo ouvidos, pode associar
Sou todo ouvidos, pode associar!
Meu analista (Doutor, eu não me engano)
Doutor, eu não me engano
Meu analista é freudiano
Eu não sabia mais o que falar
Mandei meu analista
Parar de interpretar
Ah, Doutor eu não me engano
Meu analista é freudiano
Unidos do Inconsciente - Hino
Sexualidade é desde a infância
Mas agora a fase é genital
Só se fala do falo
Fica o seio bom, sai o seio mal
Porque hoje é carnaval
Esse bloco é suficientemente bom
Pra você gozar no final
Sem recalque e sem castração, meu amor
Porque hoje é carnaval
Ah, mainha! Deixa eu gostar de você
Ah, mainha, sem você não vou viver
Faz um holding pr'eu crescer!