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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    41 Abril 2017  
 
 
NOTÍCIAS DO DEPARTAMENTO

ENTRETANTOS II, MESA 7B


 

MARIA ELISA PESSOA LABAKI [1]

 


Foi tarefa nos três trabalhos desta mesa reconhecer o fazer psicanalítico enquanto prática política. O que leva a conceber Psicanálise e Política não como campos extrínsecos e relacionados por contatos pontuais, mas reciprocamente intrincados, se superpondo e habitando um no outro. Assim, se a psicanálise nunca é apolítica - ao contrário do que queria a IPA e seus satélites nos anos 70 -, por outro lado não seria tampouco pertinente vê-la como prática passível de ser “politizada”, isto é, de ser submetida à ordem da política. Especifica neste sentido Moisés Rodrigues, em seu texto Psicanálise em instituição, que “o trabalho clínico é uma atuação política sem necessariamente ser um ativismo político”. Em se tratando da psicanálise, portanto, política não seria uma qualidade de sua prática, mas antes, diria respeito à natureza substantiva de sua inclinação mais íntima no manejo cotidiano da palavra liberta da opressão. Seja a opressão genealógica, dado o inacabamento do humano; a social, oriunda do ambiente autoritário, agressor e bárbaro; ou ainda, a superegóica e inconsciente que cala o desejo.


Interessada na mobilidade e plasticidade, bem como comprometida com os processos de transformação, a clínica psicanalítica põe em marcha condições para a emergência de liberdade condicionada à lógica do desejo possível, que desaliena dos imperativos autocráticos do Ideal e desperta, por efeito, a vontade de ser modestamente alguém que se dirige para algum lugar. A exemplo, temos o trabalho de Marcus Goes, Helena Gusso e Felipe Pisciotti, Psicose, democracia e dispositivos institucionais da escuta psicanalítica, que relata um programa da Clínica de Projetos do Projetos Terapêuticos através do qual pretende-se uma passagem do ensimesmamento da loucura para fora da instituição, alcançando a cidade. Aqui, a força da grupalidade nas decisões revela o poder do povo e das semelhanças que unifica os sujeitos em respeito às diferenças – demo kratos -, através do encontro dialógico que expõe e reflete sobre as razões de cada um. Singularidades compartilhadas em solo fraterno e democrático.


A vocação social da psicanálise não se traduz apenas em função das conhecidas ações terapêuticas do mundo contemporâneo, que vão além dos limites do consultório particular, como bem nos mostra o trabalho de Atílio Bombana, Maria Laurinda Ribeiro de Sousa e Silvia Bolguese, intitulado A clínica social: do que se trata hoje?. Mas está na base da elasticidade do método analítico a propriedade “social” de sua escuta, este dom do analista em ir lá no ponto de onde fala, cala e sofre o sujeito. Portanto, intervenções terapêuticas psicanalíticas realizadas em instituições, ruas e outros equipamentos públicos representam ampliações derivadas desta capacidade móvel e elástica, inerente à psicanálise. Daí comprovar que podem ser grandes e significativos os benefícios na sociedade quando esta se vê escutada em seu sofrimento. Bem como renovador para o analista que reencontra sua cidadania através de seu ofício. Inúmeros exemplos apresentados no debate que se seguiu às apresentações dos trabalhos confirmam o caráter social do método clínico psicanalítico.


Ao cabo desta nota, aponto para uma curiosidade feliz entre os textos apresentados nesta mesa. A polissemia embutida no título do trabalho Psicanálise em instituição, sugere uma imagem circular e contínua, um gerúndio para a psicanálise não cessar de instaurar-se. O que, por si só, já seria bem sugestivo, não fosse a notável correspondência desta imagem com uma linda figura desenhada no texto A clínica social: do que se trata hoje?. Nele, é criada uma nova metáfora, a do diamante, em substituição à máxima freudiana que contrapõe ao ouro da associação-livre, o cobre da sugestão: “além de precioso, ele (o diamante) se constitui com diversas facetas e pode se transformar, por meio de uma técnica especial, ou pelo decorrer do tempo, em grafite – o que possibilita novas inscrições e novos escritos”.


Eis aqui nossa psicanálise, potente, política, mutante.


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[1] Psicanalista. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae.




 
 
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