Maternidade e Primeira Infância em Questão: Uma Intervenção a Tempo

 

Carolina de Castro Lemos, Julia Clemêncio de Salles Teixeira

 

 

RESUMO

O presente trabalho propõe discutir, de um lado, os efeitos psíquicos do isolamento e desamparo social os quais as mães têm vivenciado na contemporaneidade e, de outro, entrelaçar a questão da urgência do tempo da intervenção na infância para a criança. Na escuta psicanalítica, tem sido cada vez mais frequente as mães falarem de um desamparo em relação ao cuidado dos filhos. A questão é atual também porque vem a responder aos ideais de nossa época, quais sejam, de um indivíduo independente no neoliberalismo, que por ser dono de si, deve fazer a si mesmo sozinho (SAFATLE, 2021). Nessa ordem de ideias, é frequente a falta de assistência estatal, o que nos leva à reflexão a respeito de como oferecer uma intervenção a tempo, quando o desamparo vivido pela mãe coloca em risco a constituição psíquica da criança. Quando uma criança se encontra em uma situação que ameaça ou viola os seus direitos, é preciso que os atores do Estado e da sociedade civil - como por exemplo aqueles que compõem o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e Adolescente - sejam acionados e trabalhem em prol desse núcleo familiar, para que a situação de risco possa ser devidamente cuidada e reparada. Quando isso não é possível, determina-se o acolhimento. Por trás dessa medida há uma família negligenciada pelo Estado, que carrega marcas transgeracionais de violações de direitos, onde a intervenção não foi feita a tempo. Buscamos, portanto, compreender esse sofrimento em sua dimensão sociopolítica (ROSA, 2016). Do lado da mãe, acreditamos que, como resultado dessa cadeia de desamparos, ocorrem impasses na transmissão familiar (ROSA, 2020), chegando a produzir uma fratura na função materna. No Brasil ainda necessitamos de aprimoramento e investimento nas políticas de proteção da criança e do adolescente. Tem-se com o acolhimento familiar um exemplo de política que nos últimos anos vem crescendo, ainda que a passos lentos: uma alternativa aos serviços de acolhimento institucionais (conhecidos como SAICA) e casas lares. A Família Acolhedora integra a sociedade civil e, partindo de um desejo em cumprir um papel social, recebe em sua casa uma criança que encontra-se em medida de acolhimento, até que a sua situação seja endereçada. Quanto mais nova a criança, maior o efeito da institucionalização no seu desenvolvimento, sendo extremamente benéfico que ela possa estar em um núcleo familiar e individualizado quando se encontra separada da sua família de origem. O que pode a escuta analítica diante desse contexto? Para ilustrar as questões acima delineadas, apresentaremos dois casos de atendimento na clínica psicanalítica: o caso de uma mãe biológica, que teve seu poder familiar destituído, colocando em cena o luto insólito da filha perdida; e o caso de sua bebê, que teve uma intervenção realizada a tempo para sua constituição psíquica e que fora, posteriormente, cuidada por uma Família Acolhedora até sua adoção.

 

PALAVRAS-CHAVE: Maternidade, primeira infância, sofrimento sociopolítico, intervenção a tempo.