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Trabalhos

A Sexualização da infância: o relato de caso de um menino de oito anos

Silvia Beier Hasse: Psicóloga, graduada pela USP (2011), fez o curso de Especialização em Psicanálise com Crianças do Instituto Sedes Sapientiae (2015) e atualmente é membro do Departamento de Psicanálise com Crianças do mesmo Instituto. Atua há seis anos atendendo crianças em consultório e atualmente trabalha como orientadora em curso pré-vestibular de São Paulo.

Eixo temático: Sexualização da Infância

Resumo

O presente trabalho irá apresentar o caso clínico de um menino de 8 anos, levado à consulta por iniciativa de sua mãe, Vera, e insere-se no eixo temático da Sexualização da Infância. Vera, na primeira entrevista, apresenta o filho dizendo: “Kaio agrega tudo o que não queremos em um filho”. Kaio era um menino agressivo e desobediente, que falava muito palavrão e tinha a “sexualidade muito aflorada” – chamava a mãe de “gostosa”, apertava seus seios e dizia constantemente, “quero te comer” (sic). Entretanto, na escola era um menino educado. A mãe chorou na entrevista; contou que o marido batia no menino e perguntou, desesperadamente, o que deveria fazer.
Vera engravidou de Kaio aos 38 anos e era seu terceiro filho (o mais velho era filho de um primeiro casamento, tinha 20 anos, e a segunda filha 12). Ela planejava se separar do marido, Vicente, pois ele era alcoolista. Ela sofreu de depressão durante a gestação e, desde o nascimento do menino, Vera mantinha-no na cama de casal com ela, para não ter mais relações sexuais com o marido. Este, por sua vez, dormia em uma cama ao lado, ficando os três no mesmo quarto. O pai tinha atitudes também abusivas com o menino, dando-lhe banho e indo ao banheiro lhe limpar, depois de Kaio evacuar.
Kaio, com a analista, comportava-se bem. Ele chegou a enunciar espontaneamente, logo na primeira sessão, que iria ao dentista quando saísse do consultório, porque estava “obturando”. Queixava-se que os pais não deixavam que ele trancasse a porta do banheiro para tomar banho e afirmava que queria um quarto e uma cama só sua, mas ao mesmo tempo achava bom dormir com a mãe.
A serviço de quê e de quem Kaio era colocado em tal posição? Os pais não reconheciam que eles mesmos eram figuras que estimulavam sua sexualidade, em uma idade tardia. Não conseguiam enxergar os próprios atos como impróprios. O sintoma de Kaio “é um representante da verdade do casal familiar, (...) nesse sintoma se articulam questões que dizem respeito à fantasia inconsciente e ao desejo inconsciente de ambos os progenitores” (Lacan 2003, apud Gueller 2011, p. 23). Gueller (2011) expõe que, nessas situações, é necessário intervir com a criança, mas também com o casal, e com o pai e a mãe em separado. Porém, a análise deflagra a verdade denunciada através do sintoma da criança, e muitas defesas foram mobilizadas neste tratamento. O caso permaneceu em análise por um ano, até que os pais interromperam o tratamento.


Palavras-chave: sexualização da infância; sintoma; resistência.