MARIA LAURINDA RIBEIRO DE SOUSA[1]
Em 8 de junho de 1972, a fotografia de Kim Phuc, uma menina vietnamita de 9 anos de idade, correndo em desespero pelas ruas após ser atingida pelos explosivos de Napalm, marcou, para sempre, corações e mentes[2].
Em 23 de julho de 1993, um massacre ocorrido na frente da igreja da Candelária, no Rio de Janeiro, revelou ao mundo a tragédia de 8 crianças e jovens mortos cruelmente. A marca de seus corpos está até hoje inscrita em vermelho no cimento e no coração de quem viveu esse horror.
Em 2 de setembro de 2015, um menino sírio de apenas 3 anos de idade, Aylam Kurdi, foi encontrado morto na praia de Bodrum, na Turquia. Uma denúncia virulenta do que acontece com os refugiados que procuram um lugar “minimamente hospitaleiro” para o seu estar no mundo. Ele está de bruços no mar – uma denúncia de que este nosso mundo não pode ser olhado de frente.
Essas cenas – e muitas outras – que passaram a fazer parte de um cotidiano sinistramente inquietante, criaram uma fenda no que poderia ser a solidariedade humana.
FENDA
Não há pássaros no ar
Nem brisa
Nem sombras
Uma criança morreu.
Estaremos realizando a profecia de Hannah Arendt quando afirmou ser “perfeitamente concebível que a era moderna venha a terminar na passividade mais mortal e estéril que a história jamais conheceu”?
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[1]Psicanalista. Membro do Departamento de Psicanálise, integrante da Diretoria do Instituto Sedes Sapientiae na gestão 2013-2015.
[2]A expressão corresponde à tradução para o português do título do documentário Hearts and minds (Peter Davis, 1974) sobre a Guerra do Vietnã (nota do editor).