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    JORNAL DIGITAL DOS MEMBROS, ALUNOS E EX-ALUNOS
    46 Junho 2018  
 
 
NOTÍCIAS DO DEPARTAMENTO

MEDIAÇÃO E COMPOSIÇÃO GRUPAL: CONFERÊNCIA DE ANNE BRUN


EQUIPE DO BOLETIM ONLINE



No dia 16 de abril de 2018, apresentou-se no auditório do Sedes a psicanalista francesa Anne Brun com a palestra Mediação e composição grupal. A comissão organizadora foi composta por Chistiana Freire, Christiane Abud, Claudia Justi Schönberger, Márcia Bozon e Sylvia Ribeiro Fernandes. Na primeira parte do evento, depois de apresentada por Anna Mehoudar, coordenadora do evento, a palestrante discorreu sobre a importância da mediação na clínica de casos graves (psicose e autismo). Este trabalho surgiu a partir da constatação da insuficiência dos dispositivos clássicos da psicanálise para trabalhar com tais pacientes. A partir deste trabalho, foi constatado que o uso de médiuns maleáveis - conceito criado por Marion Milner na década de ´50 - como fotografias, pinturas, fantoches, argila e teatro com pacientes graves possibilita dar forma ao não simbolizável.

Atualmente Anne Brun busca com outros pesquisadores construir uma teoria geral que leve a uma metapsicologia da mediação e do médium maleável que o distinga de trabalhos como o de arte terapia, por exemplo. Brun comenta que, embora vários colegas acreditem que o trabalho do psicanalista neste campo seja apenas o de supervisão, ela acredita que o psicanalista deva trabalhar diretamente com estes dispositivos com pacientes que apresentem patologias do narcisismo e de identidade, pois a transferência e a associatividade características do método psicanalítico dão especificidade ao atendimento. Para ilustrar sua forma de trabalho, a psicanalista trouxe algumas sessões de grupo com as imagens produzidas pelos pacientes ao longo de um processo de atendimento.

Na segunda parte, Sylvia Ribeiro Fernandes, membro do Departamento e integrante do projeto Compor, da Clínica Psicológica do Instituto Sedes Sapientiae, compartilhou um relato de caso com a palestrante. O projeto atende em grupo pessoas com grande sofrimento psíquico, através do trabalho com fotografias, na busca de, através da figurabilidade, restaurar a ligação entre afeto e palavra e a capacidade de sonhar. A discussão foi bastante enriquecedora e trouxe vários elementos para esclarecer a complexidade deste tipo de trabalho.

Segue abaixo o texto da apresentação da palestrante feita por Anna Mehoudar. O leitor pode acessar a gravação completa da palestra por meio do link https://www.youtube.com/watch?v=Qu7w-7bhULI .





MEDIAÇÃO E COMPOSIÇÃO GRUPAL: APRESENTAÇÃO


Anna Mehoudar [i]



Quero agradecer a Christiana Freire, articuladora da área de Eventos no Conselho de Direção, e a Claudia Justi, desse mesmo Conselho, que formalizou o convite, em nome da Comissão Organizadora, para que eu compusesse essa mesa.

Gostaria de estender meus agradecimentos a Cristiane Abud, da Comissão Organizadora desse evento, com quem formamos, no Conselho de Direção 2012-2014, uma produtiva frente árabe/judaica. Com sua colaboração enquanto articuladora da área de Eventos reiteramos a nossa vocação político-institucional; refiro-me aqui ao colóquio sobre Grupos e instituições, além daqueles sobre A psicanálise e a ditadura-civil militar e O racismo e o negro no Brasil – que resultaram em publicações que muito nos orgulham.

Elô Lacerda - membro desse Departamento - foi generosa em compartilhar anotações do curso que Anne Brun realizou em Brasília, no Encontro da ABEBE de 2013.

Anne Brun volta ao Brasil a convite do II Colóquio Internacional da Rede Interuniversitária de Grupos e Vínculos Intersubjetivos que acontece nessa semana no Mackenzie, e que contou com o apoio do nosso Departamento, graças à ponte estabelecida por Cris Abud. No Colóquio Anne Brun falará sobre Objetos Mediadores no trabalho com grupos.

No final de abril a psicanalista estará no Encontro da ABEBE onde falará sobre Formas de expressão corporal do sofrimento psíquico em crianças psicóticas e autistas, e seu tratamento com mediações terapêuticas , e ministrará o curso pré-encontro Sensório-Motricidade e formas primárias de simbolização. As suas apresentações dizem a que vem.

René Roussillon resgata historicamente a mediação nos dispositivos clínicos a partir de Sigmund Freud, que teria escolhido a linguagem como médium por excelência do trabalho analítico. Quando Roussillon propõe uma Metapsicologia da mediação e do médium maleável lembro do trabalho de Nise da Silveira, única mulher a se formar em medicina na Bahia de 1931, aos 21 anos de idade. Casa-se com o colega de turma e sanitarista Mário Magalhães da Silveira e juntos se mudam para a então capital do país. Após concluir uma especialização em psiquiatria é aprovada em concurso público.

Nos anos 1930 o casal milita no Partido Comunista Brasileiro quando, por apreciar literatura marxista, Nise é denunciada por uma enfermeira que trabalhava com ela, ficando presa por 18 meses. Afastada do serviço público, permanece na semiclandestinidade, com o marido, de 1936 a 1944, quando é reintegrada ao serviço público.

No Centro Psiquiátrico Pedro II, no bairro do Engenho de Dentro, Rio de Janeiro, a psiquiatra se contrapõe frontalmente à violência das práticas médicas. Na tentativa de silenciá-la, a direção do hospital desloca Nise da Silveira da clínica para o trabalho com terapia ocupacional. A criação de oficinas de artes plásticas que estimulavam os pacientes a se expressarem utilizando a pintura, a modelagem e o desenho entre outros médiuns oficializa, em 1946, a Seção de Terapêutica Ocupacional do hospital.

Em contato com Carl Gustav Jung, inicia uma trajetória na qual “Nise da Silveira desloca a problemática da loucura, em geral, e da esquizofrenia, em particular, do campo da psicopatologia médica para o campo da cultura, entre outros aspectos”,segundo o psicanalista João Frayze-Pereira.

Em 1952 ela funda o Museu de Imagens do Inconsciente, destinado à preservação dos trabalhos produzidos no Engenho de Dentro e, depois, a Casa das Palmeiras, uma clínica de portas abertas - voltada à reabilitação de antigos pacientes de instituições psiquiátricas.

Antecessor de Nise da Silveira e apontado como precursor no uso de materiais plásticos no tratamento de doentes mentais graves, o psiquiatra Osório César dirigiu o Hospital Psiquiátrico do Juqueri, na cidade de Franco da Rocha, São Paulo, onde criou a Escola Livre de Artes Plásticas. Osório César manteve correspondência com Sigmund Freud, que publicou uma resenha sobre seu livro A arte primitiva dos alienados, em 1925. Ele foi membro fundador das Sociedades Brasileiras de Psicanálise de São Paulo e do Rio de Janeiro e homenageado, postumamente, com a fundação do Museu Osório César Museu Osório César no Hospital do Juqueri, em 1985. Foi casado com Tarsila do Amaral.

O uso de médiuns maleáveis no tratamento das esquizofrenias e de casos difíceis tem ampla tradição em nosso país, e transborda para exposições, museus, livros, documentários e filmes. No entanto, a formulação de uma metapsicologia dos médiuns maleáveis, aliada ao trabalho com grupos, amplia a pesquisa e traça novas perspectivas teórico-clínicas para a psicanálise. A sistematização do trabalho com grupos, à semelhança de amplo estudo brasileiro sobre os indicadores clínicos de risco para o desenvolvimento infantil (IRDI) busca responder à clínica cognitivo-comportamental que ganha cada vez mais espaço junto à classe médica.

Deixo a palavra com Anne Brun, professora de Psicologia Clínica e Psicopatologia, diretora do Centro de Pesquisa em Psicopatologia e Psicologia Clínica da Universidade de Lyon 2. Seus interesses de pesquisa são psicopatologia da criança (especialmente autismo e psicose), psicopatologias graves do narcisismo, do corpo, mediações terapêuticas, abordagem psicanalítica da criação, avaliação clínica das psicoterapias psicanalíticas. Ela tem várias publicações:

Mediações terapêuticas e psicoses infantis (2009), ed. Herder, Dunod.

Em colaboração com Chouvier B., Roussillon R. eds, Manual de mediações terapêuticas, Dunod.

Em colaboração com Roussillon R. eds (2016), Avaliação clínica de psicoterapias psicanalíticas. Aparelhos individuais, de grupo e institucionais , Dunod, 2017, Psychiatric Evolution Award.

Nas origens do processo criativo (2018), Erès.

Com consistência clínica e um cadinho precioso de referências teóricas ela nos falará sobre mediação e composição grupal.

Depois teremos uma pausa para um café e para terminar, uma discussão clínica com a participação do Projeto Compor da Clínica Psicológica do Instituto Sedes Sapientiae.

Muito obrigada.





[i] Psicanalista. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae.




 
 
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